Da dor
Postado em: dezembro 07, 2010 por Marcio Carvalho emA palavra corta mais profundo e fere mais permanentemente que a lâmina.
A palavra corta mais profundo e fere mais permanentemente que a lâmina.
O que sinto é sujo.
É feito de pensamentos sórdidos, de saliva, de pele, de gemido, de dor, de prazer e de gozo.
O que sinto é lírico.
É feito de versos, de poemas escritos em papel de guardanapo, é feito de canções, de olhares.
O que sinto é épico.
É feito de longas despedidas, de brigas, de fugas, de choro de madrugada.
O que sinto é fulgaz.
É feito de momentos transitórios, é feito de detalhes que passar, de cores que desbotam.
O que sinto é profundo.
É feito de coração, corpo, alma, sangue e sonho.
O que sinto é feito de você.
De mãos dadas, eles olham o céu noturno.
As estrelas iluminam os dois em uma luz pálida e levemente azulada.
Eles ficam em silêncio. O mundo fica em silêncio. O universo fica em silêncio.
E ali, naquele instante, eles são felizes.
"Você devia se deixar levar pelo que sente."
"Mas eu não posso. Eu sinto demais, quero demais. E tudo o que sinto e quero muda o tempo todo. E se eu me perder?"
"E se você se achar?"
A vida é injusta.
Como é injusto o coração.
Egoísta, carente, amoral.
O coração não ouve nada além de suas próprias batidas.
Eles dançam no meio do salão. Os refletores os iluminam, criando uma atmosfera de ilusão no mundo. Nas sombras, os olhos de todos os convidados os observam, alguns com esperança, outros com inveja. Mas sempre com a reverência de quem assiste a algo único.
A música preenche o ar.
Os olhos dele cruzam incessantemente o olhar dela.
Ele acaricia de leve a mão dela, enquanto eles se movem na dança.
No silêncio dela, ele ouve promessas de amor eterno. Mas dos seus lábios ele ouve o afastamento das palavras.
Ela deseja ser guiada, mas o medo e as dúvidas a seguram.
Ele deseja que a dança dure para sempre. Deseja calar as palavras receosas dela com um beijo.
Ele quer ser o par dela eternamente.
O corpo dela responde a esse desejo. Os olhos dela respondem aos olhares dele.
O coração dela bate em uníssono com o coração dele.
Mas perto do último acorde, ela hesita.
O coração perfurado sangra.
O líquido rubro escorre, lenta e continuamente.
O órgão bombeia o próprio sangue para fora.
Uma dor agonizante toma o peito.
Aos poucos a dor se torna um vazio.
A seta é precisa em sua trajetória.
Sempre, sempre acerta o alvo.
Com uma ponta de ferro chamada amor.