Da verdade

Postado em: maio 01, 2011 por Marcio Carvalho em

Ela é o pensamento sórdido mais puro que ele tem.
Ela é o segredo mais obscuro e público.

Porque o silêncio não esconde o que os olhos gritam.

Da chama

Postado em: por Marcio Carvalho em

As velas fazem o ambiente ficar com uma aparência surreal. Ela se sente em um outro tempo, outro local. Ela fica olhando absorta para as chamas, mas a todo instante a sensação de que há alguém mais ali a acompanha.
Ajoelhada sobre a cama ela sabe que ele está ali. Nas sombras, vendo-a. Estudando-a. Ela pensa nos olhos dele. Um olhar triste, mas que parece querer sempre mais.
Ela sente aqueles olhos ali, em algum lugar. Um arrepio na nuca a indica que ele está vindo.
Ele se ajoelha na cama, atrás dela.
Ela tenta se virar, mas ele a segura pelo ombro, virando-a novamente para frente. Sem olhares, hoje.
As mãos dele começam a percorrer-lhe o corpo. Elas são quentes, dedos que se movem, procurando os pontos onde a sentem mais sensíveis, explorando-a. O toque é firme e delicado ao mesmo tempo. Ela pensa para si mesma que sentia saudade daquelas mãos.
Uma das mãos busca o seu seio. Ela sente o aperto, enquanto a outra mão corre por sua coxa, subindo até encontrar casa dentre suas pernas.
Ela suspira de antecipação, ao mesmo tempo, sente os dentes dele roçando de leve seu pescoço.
O suspiro se torna um gemido. Os dedos dele brincam em seu corpo. Ela se sente quente, úmida por dentro.
A língua dele, os beijos, os dentes no pescoço a fazem esquecer onde está. Olhos desfocados se perdem dentro dela mesma.
As mãos dela buscam por ele. Ela o sente latejando em sua mão. Seu gemido fica mais alto. Ela agora se mexe para os dedos dele. Quer que eles a conheçam, quer que eles busquem pelo prazer dentro dela.
Ela fecha os olhos, enquanto geme. A respiração entrecortada. Ela dobra o corpo, quando a mão desce do seio até o quadril.
Ele fala baixo, rouco, uma ordem:
- De quatro.
Ela sorri. Sem nunca olhá-lo, abaixa o corpo, expondo-se para ele.
Ele a penetra devagar, com um suspiro quase religioso. Uma das mãos na cintura dela, enquanto a outra arranha-lhe as costas.
Eles se movem devagar, cada movimento é uma torrente de sensações.
O movimento vai aumentando de velocidade e intensidade. Ela não quer que aquilo acabe nunca. Seu corpo queima, derrete, irradia sensações em todas as direções.
Ele a puxa para si com força. O corpo dela é quente. Ele quer estar todo dentro dela.
Ela sente as mãos dele, seu sexo, seu corpo quando os dois se encontram, com a violência de quem quer tudo.
Ele segura os cabelos longos dela, cavalgando-a, sentindo o corpo dela remexer cada vez mais.
Ele geme cada vez mais alto, as estocadas cada vez mais intensas.
Até que ele grita, como se uma parte de sua alma fosse arrancada de si e transferida para ela.
Ela sente o gozo dele dentro de si e o corpo dela responde na mesma intensidade. Ela sente as chamas que há pouco estavam nas velas consumirem seu corpo.
Por um segundo, os dois se anulam. Não há dois corpos sobre aquela cama, há um ser, uma mistura dos dois, feito de gozo, carne, fluídos e sons.

Ela abre os olhos. As velas estão lá. Ele está lá.
O som da respiração dos dois preenche o quarto.

Ela é uma cascata de emoções, agora.

Mas ela não quer pensar. Ela quer mais.

Das dores de crescimento

Postado em: abril 28, 2011 por Marcio Carvalho em

É tão estranho, falar sobre você.
Acho que nunca consideramos muito essa ideia, quando somos crianças. Acho que não pensamos que nossos pais vão morrer um dia, que é o curso natural das coisas.

Sinto sua falta, mãe. Sinto falta dos "causos" que contava sobre sua infância em Minas Gerais. Tinha um gosto bom, como se tudo fosse um filme que só você tinha assistido, mas que contava com muitos detalhes para meu irmão e eu. E você sempre foi uma pessoa brigona com a gente, mas quando contava essas coisas, dava pra ver nos seus olhos a menina doce que você era. Como falava com carinho da sua terra, da sua gente. Lembro que, quando eu era criança e você e o meu pai levavam a gente pra passar férias na casa dos nossos avós, eu ficava todo feliz. Tentava explorar a fazenda do vovô, pra tentar descobrir aqueles lugares dos quais você contava.

Sinto falta das suas comidas. Mesmo eu sendo a ovelha negra da família, o filho desgarrado, que só vinha para casa praticamente pra dormir, depois que fiquei adulto, quando eu chegava você me recebia com o mesmo olhar carinhoso de quando eu voltava da escola ainda criança e tinha um almoço quentinho me esperando. Lembro dos almoços de domingo, quando meu pai ainda não tinha os bares e ficava o final de semana em casa. Eu adorava o macarrão com frango no domingo. Acho que nunca mais comi um macarrão tão bom. E quando era meu aniversário, você sempre preparava o meu pavê. Esse doce tem gosto de aniversário pra mim.

Sinto falta das broncas por qualquer coisa que você dava. Seu jeito mandão, seu amor durão comigo e com o Max. Sei que eu respondia demais, mas acho que era porque eu tinha muito de você em mim.

Mas eu sinto falta, mais do que tudo, daquele abraço que me dava quando eu passava muito tempo longe de casa. Eu sempre gostei de viajar, sempre fui o que queria explorar, conhecer o mundo todo, abraçar tudo. Mas eu também sempre soube que quando o mundo estivesse grande demais, eu poderia voltar para a minha casa. Sentar no sofá, do seu lado e esperar aquele abraço que só uma mãe sabe dar. E aquele beijo que remendava qualquer buraco no meu coração.

Sabe? Alguns dias eu queria muito ter esse beijo de volta.

Mas você se foi. E foi tudo tão rápido. Ainda lembro quando me ligou falando da doença. Pela primeira vez da minha vida, você me ligara chorando. A pessoa mais forte que eu conhecia no mundo, falando que estava com medo. Eu fiquei com um nó na garganta, um misto de medo, vontade de ir correndo te abraçar, vontade de parar o mundo e vontade de voltar a ser criança e ficar no seu colo.

E depois, pouco antes de você ir para o hospital, naquele dia na sua casa, quando você encostou a cabeça no meu ombro e chorou, dizendo que estava com medo de morrer. Sabe, mãe... Eu me senti tão pequeno e tão velho ao mesmo tempo. Pela primeira vez na minha vida eu senti o que deve ser o sentimento de ser responsável de verdade por alguém. Me senti seu pai, ali. E mesmo com todo esse poder, eu nada podia fazer além de te abraçar.

Na última noite que passei com você. A sua última noite com a gente, foi uma noite estranha. Em vários momentos, você não estava ali, naquela cama de hospital. O seu corpo estava, mas aquela era só uma casca. A minha mãe parecia já ter ido para um outro lugar. Acho que só aguentou aquela noite para se despedir da gente, né? Seria algo típico seu.

Eu nunca falei isso com ninguém, mas eu senti uma coisa nova, depois que tudo acabou. Quando soubemos que você tinha partido, estávamos todos juntos, meu pai, o Max e eu. A atendente do hospital avisou que o médico responsável queria falar conosco. Quando ela falou isso, eu já sabia. Meu irmão e eu nos olhamos, com o olhar que só irmãos sabem dar. Não foi preciso dizer nada.

Depois que tudo terminou, na noite depois do enterro, eu fiquei muito quieto, pensando. E eu preciso te falar, mãe, que eu fiquei orgulhoso de mim. Eu, o caçula, o "baixinho", como dizia meu irmão, tomei todas as providências. Eu me disse baixinho, no escuro: "Viu, mãe? Você me criou direitinho pra enfrentar esse mundo. Obrigado, tá?"

Obrigado, mãe.

Mas eu queria ter feito mais, nos anos anteriores. Queria ter te dito todas as coisas que fiz e não te contei. Eu queria ter te mostrado as coisas que escrevo, desenho e pinto e que escondi sempre, porque achava que você iria comparar com as coisas que meu irmão fazia. Eu queria ter falado da minha sensibilidade que escondia atrás das minhas rebeldias e dos sumiços.

Queria ter só olhado para você e dito mais vezes que a amava.

Acho que não importa o quanto tenhamos nos mostrado para quem amamos. Quando a pessoa vai embora, achamos que precisávamos ter feito as coisas de forma diferente.

Não há manual para a vida. Não tem fórmula mágica, nem jeito certo de agir. A gente só tem as nossas experiências e o que os nossos pais nos ensinaram. E você me ensinou muito, mãe. Muito.

Crescer é isso, né? Essas pequenas dores, esses pequenos arrependimentos que, ou a gente transforma em algo positivo, ou ficarão para sempre nos assombrando.

Crescer é perceber um dia que os nossos pais vão embora, mas que o que eles nos deixaram vai ser parte nossa para sempre.


Como você me dizia quando eu tinha dor nas pernas, ainda menino, "crescer dói, meu bem."

Obrigado por ter me ensinado isso tudo, mãe.

Obrigado por ter sido a minha mãe.

Te amo.

Da saudade

Postado em: abril 26, 2011 por Marcio Carvalho em

Queria escrever-lhe todas as canções de amor do mundo.

Se fosse essa a cura para o que me mata aos poucos.

Amor corrói. Amor absoluto corrói absolutamente.

Queria beber ao seu lado. Nem que fosse o nosso último gole.

Baco entenderia ao que bebemos.

Eu brindaria ao que é imortal.

Eu brindaria aos filhos que teríamos um dia.

Eu brindaria ao que não existe no mundo, mas é real.

Mas essa saudade que me mata, sempre, sempre.

Essa voz que me manda não ir embora, mesmo sob os seus pedidos.

Mas eu bebo ao nada, hoje.

Bebo ao silêncio.

Bebo aos sussurros de "por favor, não vá!"

Te amo.

Te amei.

Te amarei.

Não. O tempo não cura.

Porque não é doença.

Porque não é mal.

O tempo guarda. O tempo me faz esperar.

És minha. Minha. Minha,

Como só você sabe ser.

Do egoísmo

Postado em: fevereiro 27, 2011 por Marcio Carvalho em

Me deixa ser um egoísta, hoje.
Porque quero - ou preciso - dizer que eu queria dormir com você essa noite.
E sentir o seu cheiro no meu cheiro,
Sentir suas pernas entre as minhas pernas,
Seu lábio pedindo o meu lábio,
Sua língua na minha língua.

Queria ouvir o seu gemido nos meus ouvidos,
Sentir a sua unha na minha pele,
Meus dentes no seu pescoço.

Queria sentir o meu corpo dentro do seu corpo.
Queria sentir os seus olhos nos meus olhos.

Queria sentir você chamando o meu nome essa noite.

E depois, no silêncio, queria ouvir sua respiração serena de quem encontrou paz.
E sua cabeça encostada no meu peito.

E queria te chamar de meu amor, minha mulher, minha escrava, minha senhora.

Queria te escutar sonhar e se remexer na cama.

Queria essa noite te amar e te amar,
E te fazer esquecer.
E te fazer recordar de mim.

E te fazer minha.
Minha.

Minha.

Me deixa ser egoísta essa noite e querer o melhor de nós dois.
Me deixa te pedir pra ficar.
Me deixa te fazer feliz essa noite.

Não me deixa o silêncio, hoje.

Me deixa você.
Me dá essa que escapa pelos meus dedos todas as noites.

Minha alma febril chama você.
Só você é o veneno que me mata essa saudade vil.
Só da sua boca brota esse mel que me rouba a vida e me faz eterno.

Me deixa ser egoísta e gritar para você que nós somos a única coisa que faz sentido.
Pega na minha mão por hoje.
Só por hoje.

Me ama só por hoje.

Me deixa ser egoísta essa noite e dizer que eu queria te ouvir dizer
"Fica".

Do sangue

Postado em: fevereiro 17, 2011 por Marcio Carvalho em

Ele faz o corte no pulso dela.

Ela tenta puxar o braço, mas ele a segura. Eles se olham nos olhos e ela esquece da dor.

Ele toca com os dedos a ferida. O líquido vermelho e quente escapa do corpo dela.

 O coração dela dispara. Ela não sabe o que dizer, não consegue pensar em mais nada além dos olhos dele, do aperto gentil e firme mão dele em seu braço e em seu próprio sangue.

Ele começa a beijar o braço. A língua escapa de tempos em tempos da boca e ela a sente úmida e quente na sua pele. Ele desce em direção ao corte.

Ela geme. Quer dizer não, quer dizer para ele parar, mas sua voz é só um sussurro.

A língua dele toca o corte. Ela para. Olhos fixos nele.

Ele sente o gosto do sangue dela. A pressão de sua língua libera o sabor férreo e vermelho. Ele a olha, excitado, extasiado.

Ela busca instintivamente a boca que lhe beija. Sente os lábios dele. E sente o gosto do próprio sangue.

Uma sensação estranha invade-lhe o corpo. Sente que ultrapassou um limite, que foi mais forte que o medo da própria morte.

Sente que não é mais a menina que entrou naquele quarto. Agora ela pertencia a ele.

Do que não deixamos para trás

Postado em: por Marcio Carvalho em

Como convencer o mundo a parar alguns instantes, só para eu poder ir aí e te raptar pra dentro do meu mundo? Me diz? Me explica o que tenho que fazer.

Porque eu não sei se sei viver para sempre sendo essa pessoa que procura você em todos os lugares.

Quando a dor chega, no final de um dia especialmente ruim, eu queria encostar a cabeça em você, em silêncio e sentir a sua mão acariciando de leve o rosto.

Me explica como virar essa moral do avesso pra fazer todos perceberem que você deveria estar aqui e não aí?

Me ensina a te abraçar do jeito que faz que todas as dúvidas morram no calor dos nossos corpos?

Deixa o beijo e não os olhos nos guiar.

Sente a alma e não o medo.

Ouve a batida do coração e não o clamor dos relógios dos homens.

Dorme com o coração calmo, pois apesar de tudo, o mundo vai seguir.

E os erros só são erros quando nos arrependemos.